08 março 2013

Overdose


Bastava estar ali para saber o quão denso estava aquele ambiente. Não estava frio, mas sentia-se a hipotermia invadindo seus corpos, e aquilo só estava começando. Tudo dilatava, a cada segundo, o desconforto.
Valquíria não era má, apenas gostava de sentir sua mente e seu corpo tomando outro sentido de tempo e espaço. Porém, naqueles minutos tão arrastados e pesados, ela desejava com todo o resquício de sua razão, não ter engolido aquelas malditas pílulas.
Aquele menino franzino, cabisbaixo e amedrontado era Munir. Ele simplesmente sempre estava lá, mas nunca era notado, nunca era ouvido. Eu poderia dizer que não é possível desprender daqueles lábios finos e secos alguma sonoridade audível, eles mais pareciam ser apenas um corte feito com a fina lâmina de um barbeador do que com uma boca.
E ali também estava Adrian.
Contorcia-se, gritava, explodia: viam-se veias saltando de sua garganta e sangue em seus olhos. Era um monstro. Adrian não precisava das substâncias em seu corpo para sentir a vibração translúcida do seu ser, mas ele precisava dessas substâncias para vomitar todos esses monstros que habitavam dentro de si.
Aquela situação não seria como sempre foi, e todos sabiam disso, todos queriam fazer algo para mudar, mas o ar pesava sobre eles de tal forma que os imobilizava, prendiam-nos em suas camisas de força imaginárias. Era difícil respirar, era agonizante sentir seus corações batendo: o sistema nervoso de cada ser que ali se presenciava, era totalmente audível, apalpável.
Estava acontecendo.
Aquela aberração que se arreliava, jogado ao próprio vômito, à própria desgraça, há muito alucinado na sua fragilidade, escondida no seu poder, finalmente sentia que o vazio tomava o lugar do oxigênio em seus pulmões, que a sua camisa de força esmagava-o insuportavelmente, e que a cada segundo, a cada instante, sabia que o seu ser, deixava de existir.
Alucinações.
 Munir precisava exterminar aquele demônio que o atormentava. Subitamente, venceu a força da gravidade que  o segurava com tanto peso, e, num choque de delírio, descontou toda a sua loucura na cara daquela miserável anomalia em forma humana. Socou-o, punhou aquele rosto como se pudesse derramar o seu tormento em forma do líquido vermelho que se multiplicava a cada golpe.

O demônio desfaleceu-se.

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